OS INTOCÁVEIS INDIANOS: DA EXCLUSÃO
NAS ESCRITURAS SAGRADAS ATÉ AS REFORMAS DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
João Gomes Braatz
Considerações iniciais
A
cultura indiana é reconhecidamente uma das mais conservadoras no aspecto de
suas tradições e dogmas que, em sua maioria, perduram desde o início da
produção dos Vedas (por volta de 1500 AEC – Antes da Era Comum), as escrituras
sagradas que formam as bases da religião védica (que futuramente tornar-se-ia o
hinduísmo). Pode-se citar como exemplo o sistema de castas que, apesar de ser
inconstitucional atualmente no país, ainda é motivo de exclusão e discriminação
por parte das castas mais altas. Portanto, o que se objetiva com essa pesquisa
é, com base na religião e legislação indianas, compreender a visão dessa
sociedade para com os membros da casta dos “dalits” ao longo da história, desde a sua exclusão por meio das escrituras
sagradas indianas até as reformas e representações de “empoderamento” da casta,
por meio do movimento social existente no país organizado pelos mesmos, atuando
inclusive “online”.
Origens
Analisando
obras como o “Rig Veda” (o primeiro
dos grandes Vedas a ser produzido, por volta de 1500 AEC), que contém em seu
conteúdo diversas orações e rituais dedicados aos deuses, podemos observar o
“Purusha Sukta” (Hino do homem, em português), que contém a seguinte passagem
na tradução de Renou (1964, p. 46):
“Quando
dividiram Purusha, quantos pedaços fizeram? A que chamam sua boca, seus braços?
A que chamam suas coxas e pés? O Brâmane foi sua boca, de ambos os seus braços
foi feito o Rajanya; Suas coxas tornaram-se o vaixá, de seus pés o sudra foi
produzido”.
A passagem descreve o mito
de criação do homem na religião hindu, sendo cada “varna” advinda de uma parte
do corpo desta criatura mitológica de nome “Purusha”. Chama-se
“varna” estes grupamentos sociais pois a divisão do que viria a ser o sistema
de “castas” ainda não estava estruturada (CARDOSO, 1994, p. 161). Nota-se
que a criação da “varna” dos párias não é registrada, representando sua
exclusão e desprestígio na sociedade desde a primeira aparição do sistema de
divisão social nos registros mais antigos. Acreditava-se que esta “varna” tenha
sido formada a partir da poeira sob os pés do deus, já que no hino sua criação
não corresponde a nenhum de seus membros e, portanto, não seria digna nem de ao
menos ser tocada, justificando o conhecimento da casta como a dos “intocáveis”.
Muitos meios foram utilizados para consolidar esta discriminação dentro da
sociedade indiana, como a crença no “karma”,
por exemplo, em que consta que cada pessoa nascida em determinada casta mereceu
essa condição devido às suas ações na vida passada. Portanto, os “dalits”
(termo que se popularizou principalmente a partir do século XIX para se referir
aos “shudras”, “chandalas”, ou “intocáveis”) eram vistos como pessoas que
fizeram por merecer em sua outra vida terem sido “castigadas” com sua casta
nesta vida. Além disso, aceitar a sua casta e situação seria condição
primordial para ascender de casta em uma vida futura.
Utilizando
os textos sagrados para compreender a exclusão que os “sem-casta” sofriam no
período, observamos rituais que deveriam ser feitos caso houvesse contato com
um integrante da casta dos “dalits”, como é tratado por Auboyer (2002, p. 20):
“Quando,
por acaso, um homem de casta pousa os olhos em um deles, é obrigado a cumprir
rituais purificadores; ao perceber que olhou, mesmo inconscientemente para um chandala o seu primeiro gesto
é voltar-se imediatamente; depois, lava os olhos com água perfumada, para
conjurar a desgraça; deve, a seguir, abster-se de comida e de bebidas
alcoólicas, durante todo o dia”.
Podemos
observar, portanto, o quão vil as castas tidas como “superiores” viam os
“dalits”, com base nos textos sagrados do hinduísmo. Isto permite compreender
como seria o cotidiano das pessoas consideradas “intocáveis” nessa sociedade,
resignadas a viverem no isolamento em aldeias afastadas e privadas do acesso a
alguns alimentos e água, com a justificativa de que a poluiriam. Além disso, às
pessoas pertencentes à casta dos “dalits”
eram reservados os trabalhos vistos como “impuros” pela sociedade em geral,
como com lixo e fezes. Esses motivos foram determinantes para as diversas
mobilizações e reformas observadas ao longo do tempo na Índia na forma em como
essas pessoas poderiam se integrar à sociedade, como veremos a seguir.
Reformas legislativas no país
Na
Constituição de 1950, qualquer discriminação por casta foi abolida no país,
como consta no 15º artigo:
“15.
Proibição de discriminação no campo da religião, raça, casta, sexo ou local de
nascimento.
(1) O
Estado não poderá discriminar qualquer cidadão com base em religião, raça,
casta, sexo, local de nascimento ou qualquer deles.
(2) Nenhum
cidadão poderá, com base na religião, raça, casta, sexo, local de nascimento ou
qualquer deles, ser considerado inapto, obrigado, restringido ou condicionado a
respeito de -
(a) Acesso
a lojas, restaurantes públicos, hotéis e lugares de entretenimento público; ou
(b)
Utilização de poços, tanques, locais de banho, estradas e lugares de lazer
públicos mantidos completamente ou em parte por verbas estatais ou dedicados ao
uso do público em geral.
(3) Nada
neste artigo impedirá o Estado de fazer qualquer provisão especial para as
mulheres e crianças”.
Nota-se,
portanto, a aparente preocupação do estado indiano com a tradição hindu de
divisão da sociedade em castas e a discriminação que os membros considerados
das castas “inferiores” sofrem das pessoas pertencentes às consideradas
“superiores”. Porém, muito além da mudança legislativa, é de suma importância
compreender o contexto e os processos que levaram à mudança e, para tanto, é
necessário retroceder ao período anterior à promulgação da Constituição Indiana
de janeiro de 1950.
Ainda no
período de influência britânica no país, surgiram demandas por igualdade e
reformas em tradições da religião hindu, consideradas maldosas dentro da
sociedade indiana. Porém, foquemos no protagonismo “dalit” em seu
movimento social, com uma personalidade até hoje cultuada e relembrada a cada
mobilização do grupo: Bhimrao Ramji Ambedkar (1891-1956). Pertencente à
“não-casta” dos intocáveis, Ambedkar teve acesso à educação parte graças ao
serviço de seu pai no exército da Índia Britânica, porém uma educação limitada
e rodeada de preconceitos contra sua origem e condição socioeconômica.
Vivenciando as dificuldades que os pertencentes a sua mesma condição
enfrentavam em sua vida no país, Ambedkar combateu veementemente o sistema de
castas e a discriminação contra os “dalits”, inclusive tendo sido um dos
principais participantes na formulação da Constituição Indiana de 1950, que
incluiu pautas de igualdade e proibição da discriminação.
Outro ponto
relevante é a estreita ligação adquirida por Ambedkar com o Budismo. Tendo tido
contato com sua filosofia desde muito cedo em sua vida, ele a descreve em um de
seus escritos não publicados disponibilizados online pela Universidade Columbia
em: (<www.columbia.edu/itc/mealac/pritchett/00ambedkar/ambedkar_buddha/00_pref_unpub.html>),
traduzido do inglês:
“Ao final, em seu endereço, ele (um amigo pessoal de seu pai,
chamado Dada Keluskar) me deu de presente uma cópia de seu livro “On the life
of the Buddha” o qual ele tinha escrito para uma série de livros sobre o
oriente para Baroda Sayajirao (Marajá do estado de Baroda de 1875 até 1939). Eu
li o livro com um grande interesse, me impressionei muito e fui movido por isso”.
O contato
logo cedo com a religião budista fez de Ambedkar um defensor e difusor da
mesma, chegou a afirmar que “nenhuma religião pode ser comparada com ele
(budismo). Se um homem moderno que conhece a ciência quer ter uma religião, a
única religião que ele pode ter é a religião de Buda” (conteúdo completo
disponível no endereço: <http://www.columbia.edu/itc/mealac/
pritchett/00ambedkar/ambedkar_buddha/00_pref_unpub.html.>)
A difusão
do budismo por parte de Ambedkar tornou-se referência para algumas comunidades
“dalit”, o que tornou a conversão ao budismo em uma forma de lealdade com o
mesmo. Devido a toda a sua luta por igualdade e combate ao sistema de castas,
essa filosofia de gratidão e lealdade ao reformista indiano passou a ser
referida pelo termo “Ambedkarismo”. Em 2006, por exemplo, estima-se que
aproximadamente 2.500 “dalits” converteram-se ao budismo (como pode-se conferir
na reportagem da BBC de endereço:
<www.bbc.com/portuguese/noticias/story/2006/10/061014_indiacastair.shtml>)
em comemoração ao aniversário de 50 anos de Ambedkar. Sua representação ainda é
lembrada em protestos e mobilizações de comunidades que consideram a sua
contribuição como fundamental para a luta diária dos “dalits” para uma maior integração na sociedade
indiana (Figura 1).
Figura 1. Dalits erguem foto de Ambedkar em
passeata. Imagem disponível em:
<https://d1u4oo4rb13yy8.cloudfront.net/article/39231-wfjeyuoggg-1470925736.jpg>.
Acesso em: 05 jul. 2019.
A
conversão dos “dalits” ao budismo na
Índia, até mesmo pela origem da religião na região, não costuma acarretar em
duras perseguições a quem renega os deuses Hindus, apesar de não melhorar
significativamente o seu status social.
O mesmo, porém, não ocorre com as religiões Muçulmana e Cristã.
Perseguições a “dalits” convertidos
a outras religiões
Apesar
da exclusão e da discriminação aos “dalits” ainda presentes na sociedade
indiana, às pessoas nesta condição que mantém sua crença na religião hindu ou
até mesmo os que se convertem ao budismo, são reservadas por lei desde a
constituição adotada em 1950, apoio do governo em proporcionar educação
gratuita, empregos públicos e cadeiras legislativas, no que é considerado o
primeiro sistema de cotas do mundo. Em 1950, o percentual de “dalits” com ensino superior era de 1%; em 2005,
esse percentual subiu para 12%, o que fez do país um exemplo positivo da
aplicação do sistema de cotas (CARVALHO, 2005, p. 527). Porém, essas medidas de
tentativa de reparação histórica pelos séculos de discriminação ainda
resistentes no país não atingem pessoas convertidas a religiões minoritárias no
país, como o Cristianismo e o Islã. Essas religiões muitas vezes são utilizadas
como um meio de fuga do Hinduísmo visto a baixa expressão de sua “casta” dentro
da sociedade e a insistente exclusão a que são submetidos como forma de recomeçar
sua crença religiosa em uma situação de aparente igualdade com as outras
pessoas. Porém, essa conversão acaba por vezes potencializando ainda mais os
riscos de agressão e discriminação, criando outra vertente do já ramificado
movimento “dalit” (Figura 2).
Figura
2. Dalit em protesto segura placa com
os dizeres (traduzido): “Dalits cristãos
e dalits muçulmanos são filhos deste
solo.” Imagem disponível em:
<http://media02.radiovaticana.va/photo/2017/08/09/RV27437_Articolo.jpg>.
Acesso em: 05 jul. 2019
São
crescentes no país os casos de crimes de ódio motivados pela religião e queima
de igrejas, segundo fonte de relatório da “Human Rights Watch” (cujo conteúdo completo pode ser
acessado em: <http://hrw.org/english/docs/1999/09/30/india1626.htm>), e o que poderia ser um refúgio para o recomeço em outra
religião, acaba apenas por expor os “dalits”
a agressões e crimes por outro motivo. As agressões motivadas por questões
religiosas na Índia ainda são mais recorrentes devido às naturais diferenças de
crença e costumes entre seus seguidores. Um exemplo prático é a agressão e
criminalização de quem consome carne bovina, ferindo uma das principais crenças
da religião hindu. Aos “dalits”, que
já sofriam violência por acusações das castas superiores de matança de vacas
devido ao seu “impuro” trabalho com lixo e, consequentemente, limpeza das
carcaças de vacas, o que gerava acusações de que as haviam matado, veem-se em
situação igualmente arriscada ao se converterem a outras religiões. A situação
das minorias religiosas na Índia foi ainda mais agravada com o governo do
partido nacionalista hindu BJP, iniciado em 2014. Muçulmanos, por exemplo,
acusam o atual governo de intensificar as perseguições a minorias religiosas e
esforçar-se para tornar a Índia um país exclusivamente hindu (ver: <www1.folha.uol.com.br/mundo/2016/11/1834026-muculmanos-denunciam-perseguicao-de-governo-hindu-na-india.shtml>). Neste sentido, qual a participação “dalit” na política nacional, como forma de
manifestar suas reinvindicações e interesses?
Participação “dalit” na política indiana
Fruto
de diversas iniciativas de comunidades “dalit” em países como EUA e Reino Unido, que por várias vezes enviaram
representantes ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, a
discriminação por casta foi reconhecida por instituições internacionais no
final da década de 1990. Com isso, algumas organizações internacionais
voltaram-se ao problema de discriminação na Índia, como a já citada “Human
Rights Watch”, que em 1997 iniciou a produção de um relatório com a apoio da
Fundação Ford a respeito dos
problemas enfrentados pelos “dalits”, cujas demandas foram entregues ao
presidente do país na época. No entanto, a influência estrangeira no movimento
proporcionou um problema devido aos seus esforços em tentar manter uma política
de “boa governança” nas relações entre o movimento e o governo indiano, o que acarretou
em um sentimento de descrédito do movimento pelo governo. Apesar do governo ter
tentado utilizar seu arsenal jurídico e institucional na luta contra
discriminação por castas, ainda apresentava graves problemas na implementação
destes mecanismos de punição (JAOUL, 2015, p. 243).
Ao
contrário do movimento “dalit” tradicional,
com parte de seu financiamento advindo de doações das comunidades, o
financiamento estrangeiro muitas vezes pôs em conflito os que acreditavam em
uma solução prática e radical para a problemática da discriminação e exclusão
dos “dalits” e os que tinham como
preferência se reservar a atividades burocráticas, que visariam acalmar o
movimento por meio de medidas legislativas que dificilmente são aplicadas na
prática. No cenário político nacional, os “dalits” são representados principalmente pelo “Bahujan Samaj Party
(BSP)”, que alcançou o protagonismo político no período de 2007-2012 no estado
de Uttar Pradesh, o maior estado do mundo em termos de população. Porém, é
notável a decepção da comunidade “dalit” com o governo do partido no estado
acompanhando os dados das Tabelas 1 e 2, em que se pode observar a declinação
no número de cadeiras conquistadas pelo partido nas últimas eleições no estado.
Tabela 1 -
Resultados do BSP nas eleições da assembleia legislativa de Uttar Pradesh de
1991 a 2017
Ano
|
Cadeiras conquistadas na assembleia legislativa (TOTAL DE
CADEIRAS DA ASSEMBLEIA: 404)
|
1991
|
12
|
1993
|
67
|
1996
|
67
|
2002
|
98
|
2007
|
206
|
2012
|
80
|
2017
|
19
|
Fonte:<http://www.elections.in/uttar-pradesh/assembly-constituencies>.
Acesso em: 05. jul. 2019.
Tabela
2 – Resultados do BSP em Uttar Pradesh nas eleições para o parlamento da Índia
de 2009 e 2014 (O estado tem direito a 80 cadeiras no parlamento)
Ano
|
Cadeiras conquistadas no Parlamento (TOTAL DE CADEIRAS DO ESTADO
NO PARLAMENTO: 80)
|
2009
|
20
|
2014
|
0
|
Fonte:
<https://eci.gov.in>. Acesso em: 05 jul. 2019
Percebe-se
a proporcional ascensão e queda do partido no cenário político nacional e em
Uttar Pradesh ao longo dos anos. Como fatores principais para esta queda,
pode-se considerar o crescimento a nível estadual e nacional do “Bharatiya
Janata Party (BJP)”, partido conservador e nacionalista hindu, além de uma
queda na popularidade do partido devido a acusações de coligações e alianças
duvidosas para possibilitar o bom andamento do governo de Mayawati no estado
como Ministra Chefe (2007-2012). Apesar disso, a representação da casta no
governo do estado proporcionou uma sensação de “empoderamento” aos “dalits”, e
na figura de Maywati, o fortalecimento da luta das mulheres por dignidade e
principalmente contra o abuso e exploração sexual recorrentes no país contra as
mulheres “dalit”. Um exemplo prático dessa sensação por parte das mulheres é
encontrado no caso de Phulpatti Devi, que adquiriu fama local por ter cortado o
pênis de um homem de casta superior que a subornava para adquirir um empréstimo
bancário em troca de favores sexuais. Após realizar o ato, em entrevista, a
mesma afirmou a um jornalista: “Eu pensei, agora Mayawati está no poder, ela
irá me salvar”. O que mostra que, embora Mayawati não tenha tido uma
preocupação evidente em dedicar-se a uma agenda feminista, ela encorajou um
processo de identificação entre as mulheres “dalits” e consequentemente cooperou com sua busca por integração na
sociedade, representando a importância da sensação de representatividade no
governo.
O auxílio da tecnologia
Além
dos esforços em manter um movimento feito “por dalits e para dalits” financiado pelos mesmos, com o objetivo de manter o
sentimento de pertencimento e protagonismo da comunidade, há também o auxílio
da tecnologia como maneira de denunciar e compartilhar informações a respeito
de abusos e discriminações submetidas à casta. Diversos canais no “YouTube”,
“blogs” e fóruns foram criados com este fim. Pode-se citar, por exemplo, o
canal “Dalit camera” no “YouTube”,
que conta atualmente com aproximadamente 20 mil inscritos, busca, além de
formar opiniões com seu conteúdo, disseminar e denunciar agressões a “dalits”.
A rápida disseminação de informações que é possibilitada por diversos
aplicativos e plataformas possibilitou, por exemplo, um dos maiores protestos
“dalits” já presenciados no estado de Gujarat, motivados pela viralização de um
vídeo de três rapazes agredidos por serem acusados de terem esfolado uma vaca
(ver: <www.freetheessence.com.br/unplug/interventores/intocaveis-dalits-india>). Com o fácil acesso à informação, a tecnologia também
cooperou para a articulação e tentativa de unificação do movimento ainda
bastante fragmentado em projetos de mídias destinadas ao público “dalit”, como
o “Dalits Midia Watch” que, por meio
das redes sociais, busca fortalecer o movimento com a divulgação das principais
notícias do país e facilitar denúncias de discriminação contra “dalits”.
Considerações finais
Ao
realizar este apanhado histórico a respeito dos “dalits”, percebemos as suas
adaptações e avanços na busca de uma maior integração na sociedade indiana.
Partindo dos escritos sagrados de criação do homem na religião hindu, nota-se o
árduo caminho percorrido por esta casta por melhores condições de vida e maior
empoderamento. Avanços importantes já podem ser observados, como terem
conquistado por um período o governo de um dos estados mais influentes do país
por meio do partido com representação e preocupação com a causa “dalit”. Com o
avanço da tecnologia, como pudemos observar, os “sem casta” ganham mais um meio
de fazer valer as leis indianas que aboliram constitucionalmente as
discriminações por casta em 1950, embora na prática a discriminação ainda
exista.
Referências
João
Gomes Braatz é mestrando em História do Programa de Pós-Graduação da
Universidade Federal de Pelotas (UFPel), membro discente do Laboratório de
Estudos Sobre a Cerâmica Antiga (LECA). E-mail: joao.braatz@hotmail.com
Página
do LECA no Facebook:
<https://www.facebook.com/lecapoiemaufpel>.
AMBEDKAR, B. Caste in India. Caste and Democratic Politics in India.
Nova
Deli: Permanent Black, 2002. p. 83-107.
AUBOYER,
J. A vida quotidiana na Índia antiga.
2.ed. Rio de Janeiro: Shu, 2002.
BAYLY, S. Caste, Society and Politics in India from the
Eighteenth Century to The Modern Age. Cambridge: Cambridge
University Press, 2001.
BUENO,
A. Textos de história da Índia Antiga.
Rio de Janeiro: s/ editora, 2016. Disponível em:
<https://books.google.com.br/books?id=ZT4fDgAAQBAJ> Acesso em: 05. jul.
2019.
CARDOSO,
Ciro. Varnas e Classes sociais na Índia Antiga. In: Sete Olhares sobre a
Antiguidade. Brasília: UNB, 1998. p. 161-171.
CARVALHO,
J. C. Inclusão étnica e racial no Brasil:
a questão das cotas no ensino superior.
São Paulo: Attar, 2005. p. 513-529.
ÍNDIA.
Constituição (1950). Constituição da República da Índia.
JAOUL,
N. Política contra o grão. O movimento dalit de Uttar Pradesh em meio à
ONG-ização. Revista Tomo. [on-line].
ed 27. São Cristóvão: UFS, 2015. Disponível em:
<https://seer.ufs.br/index.php/tomo/article/view/4648>. Acesso em: 06
nov. 2017.
RENOU,
Louis. O Hinduísmo. Rio de
Janeiro: Zahar, 1969.
Prezado João Braatz, desde já gostaria de parabenizá-lo pela proposta desta Comunicação. Gostaria de fazer uma pergunta irrevogavelmente inserida na problemática de sua Comunicação: em sua opinião, esses movimentos pró-dalits na Índia ajudarão a configurar apenas mais um cenário de uma militância encastelada em posturas rigidamente fundamentalistas de seus defensores, contribuindo apenas para uma soma quantitativa dos componentes eleitorais em conflito pela conquista do estado político, e nada mais; ou o projeto de estado secular pós-colonial acabará absorvendo estes dalits dentro dos limites de isonomia pregados por uma democracia representativa (pelo menos em teoria)...????
ResponderExcluirOlá Matheus, agradeço pela parabenização e pelo questionamento. É possível observar diferentes posicionamentos dentro dos movimentos, trata-se de uma luta heterogênea e com mobilizações esporádicas, geralmente influenciadas por algum acontecimento contra a casta. Dito isso, creio que, baseando-me no atual momento político da Índia, a luta dos dalits fique pelos próximos anos neste âmbito de militância para uma tentativa de reorganização política.
ExcluirJoão Gomes Braatz
Prezado João Braatz, muito obrigado pela resposta, gostei bastante. Importante demais esta sua contribuição para os estudos asiáticos na academia brasileira através desta Comunicação. Parabéns para todos nós neste 3º Simpósio Eletrônico de História Oriental...!!!!
ExcluirParabéns! O texto nos mostra uma gama de informações referentes ao sistema de castas, onde os dalits sofreram e sofrem inúmeros preconceitos mediante à essa cultura, que infelizmente tem caracterização na discriminação. É interessante ressaltar que o ano de 1950, ano da constituição que aboliu a discriminação referente à castas, foi também o ano de lançamento da Declaração das Raças, esta por sua vez declarou a nível científico de que a raça humana é uma só, e que os grupos que se distinguem por fenótipos e espaços geográficos devem ser chamados de grupos étnicos. Todavia, para você, o sistema de castas para essa discriminação e fomento de preconceito, sobretudo fomentado aos dalits na Índia, está ligado também a questões raciais?
ResponderExcluirCláudia Marques de Oliveira
Olá Cláudia, agradeço pela parabenização, pelo questionamento e pela informação que trazes. Não havia feito esse paralelo com o contexto internacional na constituição indiana. Sobre as questões raciais ligadas às castas: atualmente esta questão está mais complexa, as castas estão mais ligadas a hereditariedade e ao status na sociedade. Já na antiguidade, as "varnas" (que significa "cor"), tinham sim fundamento em quem seria - ou não - ariano. O capítulo de Ciro Flamarion Cardoso que deixo em minhas referências "Varnas e Classes sociais na Índia Antiga" traz um quadro informativo destas divisões, que deixo abaixo. Sugiro a leitura caso seja de seu interesse.
Excluir1) dwidjas (teoricamente arianos)/shudras (teoricamente não-arianos);
2) entre os dwidjas: brâmanes e shátrias, grupos superiores/váishias, grupo inferior.
João Gomes Braatz
Boa Noite.
ResponderExcluirAchei extremamente interessante o texto, especialmente para as aulas de história em que se faz necessária uma atualização à respeito das leis aplicadas em relação a discriminação por castas na Índia e na luta dos próprios "dalits" em relação a este preconceito social fundamentado ainda na religião. Minha pergunta vai em direção ao preconceito ainda existente entre "dalits" que abraçam o islã ou o cristianismo, existem parcerias, iniciativas ou programas nas escolas indianas para o fim do preconceito com “dalits” cristãos e “dalits” muçulmanos, e pela sua aceitação na sociedade indiana?
Agradeço
Priscila Matiello Galon
Olá Priscila, agradeço pela parabenização e pelo questionamento. Concordo quanto a importância de abordar estes assuntos em sala de aula, às vezes acaba por passar batido com a pressa em cumprir o conteúdo.. mas é algo que abordo em sala de aula e sempre rendeu bastante discussão. Ainda mais depois da novela "caminho das índias" que chamou uma atenção do público para esta questão. Quanto a iniciativas em escolas, realmente não tenho esta informação.. este problema de perseguições a outras religiões na Índia se acentuou com a postura do atual governo, então não creio que as escolas estejam agindo nesse sentido. Ao menos não por orientação do governo.
ExcluirJoão Gomes Braatz
Boa Noite.
ResponderExcluirDentro da Índia atualmente, com a ascensão de algumas mulheres na política como a Ministra Chefe Mayawati, existe um debate em conjunto entre mulheres “dalits” e homens "dalits" sobre sua luta por igualdade na sociedade, ou são pautas tratadas separadamente?
Agradeço.
Priscila Matiello Galon
Boa tarde.
ExcluirCom a ascensão de Mayawati em Uttar Pradesh, houve uma expectativa de uma agenda consistente de luta pela integração e empoderamento dos dalits na sociedade, porém não foi bem o que aconteceu.. Apesar disso, como tratei no texto, houve uma sensação de representatividade e isto não pode ser desprezado, mesmo não tendo sido objetivo direto do governo. Existem debates sim, geralmente apoiados por empresas ou ongs. Deixo aqui um link de transmissão um evento que se propôs a debater a luta dos dalits atualmente na sociedade, no canal "Dalit Camera", citado no texto: https://www.youtube.com/watch?v=SRw-tpIRVu0
João Gomes Braatz