Alexandre Black


INDÚSTRIA E EDUCAÇÃO: UM BREVE HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO DA COREIA DO SUL
Alexandre Black

Após a Segunda Guerra Mundial a península da Coreia foi dividida no Paralelo 38 pelas duas superpotências que emergiram do conflito: EUA, que controlavam a porção sul da península, e a URSS, que controlava o lado norte. Rapidamente o governo de ocupação norte-americano iniciou um plano parcial de reestruturação agrária e do Estado na Coreia do Sul tendo em vista derrotar os movimentos revolucionários que, há tempos, estavam presentes em toda península. Em 1950, no entanto, estoura a Guerra da Coreia, com a invasão do sul por forças do norte. Ainda antes do conflito o sul vinha desenvolvendo várias políticas de cunho desenvolvimentista, após o cessar-fogo, em 1953, essas políticas são incrementadas e terminariam por tornar a Coreia do Sul um dos maiores sucessos econômicos das últimas décadas.
Desta forma a Coreia do Sul tornou-se um caso de sucesso entre a periferia do capitalismo ao unir reformas estruturais e um Estado desenvolvimentista com ampla participação na economia e foco na indústria de transformação. Fomentando o desenvolvimento econômico através de investimentos em educação, ciência e tecnologia – C&T, subsídios e favorecimento aos conglomerados (conhecidos como chaebols) esse pequeno país asiático conseguiu superar o subdesenvolvimento econômico e transforma-se num dos protagonistas das cadeias de valor internacional, de fato, em 2017 o país foi o quinto maior exportador do mundo (OEC) e, também, o quinto maior produtor industrial (LEVINSON, 2018, p. 2), sendo proeminente sobretudo na área de eletrônica, mas também na indústria automobilística, maquinário industrial e química.
Modernização da Agricultura e Indústria Como Motores Iniciais do Desenvolvimento
Após a Guerra da Coreia – 1950/53 – A Coreia do Sul implementou um conjunto de políticas para fomentar o desenvolvimento da indústria, vale salientar que a ajuda fornecida pelos EUA foi de grande importância para a recuperação do pós-guerra, de fato entre 1953 e 1960 ela representou uma média anual de 16% do PIB sul-coreano em alimentos, insumos agrícolas e industriais, maquinário no crescimento da produção industrial. Também a modernização do setor agrícola foi de grande importância para o desenvolvimento do setor secundário, a reforma agrária teve em vista quatro objetivos: i) aumentar o poder do Estado ao eliminar a classe de latifundiários; ii) reduzir o apelo do socialismo presente no norte, iii) estabelecer mecanismo de transferência de renda da agricultura para a indústria e iv) modernizar o setor agrícola. A concentração do poder no Estado permitiu que esse desenvolvesse, com grau elevado de autonomia, ao menos nas décadas de 1950 e 1960, políticas desenvolvimentistas mesmo em um ambiente inicialmente não muito propício, enquanto a modernização da agricultura foi de grande importância para o desenvolvimento do país,
Não raro as interpretações do mainstream e o senso comum explicam o sucesso da economia sul-coreana prestando muito mais atenção às fases mais sofisticadas da industrialização e subsequentes a reforma agrária (indústria naval, pesada, petroquímica, eletrônicos, etc.) e creditando a fatores duvidosos como “educação” e “livre mercado” os louros do desenvolvimento econômico. No entanto, é inexistente um país que tenha alcançado o desenvolvimento sem antes modernizar e criar uma agricultura capitalista de alta produtividade, a qual pudesse gerar excedentes a serem investidos na indústria. Quase todos os países ricos e com alto desenvolvimento humano (excluem-se aqui alguns paraísos fiscais, petromonarquias e cidades-estado) organizaram sua agricultura de modo a aumentar sua produtividade e a proporcionar um desenvolvimento sinérgico e equilibrado com o setor industrial”. (Baldasso, 2016, p. 9).
A modernização do setor agrícola permitiu controlar o êxodo rural, desta forma o Estado pode regular o aumento da quantidade de mão de obra industrial de acordo com as necessidades de demanda por trabalhadores da indústria emergente e, fundamentalmente, o governo pode impor ao campesinato uma forte política de inversão de renda do setor agrícola para o urbano. De fato, com a reforma agrária, o Estado praticamente passou a ter o monopólio para comprar a produção agrícola, e estipulava preços abaixo dos valores de marcado, revendendo por valores baixos nas cidades, permitindo que os salários na indústria se mantivessem deprimidos, aumentando os lucros desse setor e, portanto, a capacidade de investimento da indústria. Logo, segundo Toussaint (2017),
“O Estado interveio de maneira ativa e repressiva. A renda que os camponeses pagavam aos grandes proprietários foi substituída por taxas e impostos a serem pagos ao Estado. De fato, o Estado apropria-se do excedente que anteriormente ficava na posse dos proprietários fundiários. O Estado impõe que os camponeses obtenham um determinado volume de produção em relação a certos produtos. Essa quantidade deve ser fornecida aos organismos estatais a um preço fixado pelas autoridades. O preço é muito baixo, sendo com frequência inferior ao custo de produção”.
Em decorrência dessa política o padrão de vida nas regiões agrícolas não melhoram tanto quanto seria esperado pois o Estado confisca parte da renda auferida por esse setor, com o tempo, no entanto, o êxodo rural e o crescimento da produtividade do solo tenderá a aumentar a renda per capita deste importante setor, além disso a reforma agrária permitiu um maior controle sobre a imigração do campo para as cidades, evitando, ou ao menos diminuindo, a formação de bolsões de miséria e pobreza na periferia dos grandes centros, o que, no longo prazo, favoreceu os trabalhadores em sua luta por melhores salários, pois não havia, ou era limitado, o “exercito industrial de reserva” pressionando para baixo os salários.
A restruturação do setor agrícola facilitou que o Estado sofresse reformas que o tornaram mais tecnocrático e capaz de gerir um modelo de desenvolvimento baseado na tática “learning by doing”, seguindo a tática de aumento da complexidade dos bens produzidos na medida em que a economia crescia,
“De este modo el cambio estructural se asocia a dos tipos de eficiencia que pueden ser consideradas “dinámicas”, es decir, que conjugan trayectorias de más rápido crecimiento de la productividad, la producción y el empleo en el tiempo. La primera es la llamada “eficiencia schumpeteriana”, donde destaca la presencia de sectores con tasas más altas de crecimiento de la productividad, con mayor difusión de conocimientos y capacidades hacia el conjunto de la economía y la sociedad, y que lideran el proceso de innovación, impulsando los aumentos de productividad, tanto en su propio sector como hacia otros sectores. La segunda es la “eficiencia keynesiana” o “de crecimiento”, que refiere a un patrón de especialización en sectores beneficiados por tasas más altas de crecimiento de la demanda externa e interna, con efectos positivos sobre la producción y el empleo”. (CEPAL, 2012, p, 17).
Logo, caminhando constantemente para ramos mais intensivos em capital e tecnologia a Coreia do Sul não apenas conseguiu manter altas taxas de crescimento econômico por um período muito longo, mais de cinquenta anos – apesar dos percalços como a crise da dívida de 1982 e a crise asiática de 1998 –, como conseguiu fazer o “cambio estructural” da indústria até tornar-se, recentemente, um país de intensa produção tecnológica.
O caminho percorrido pela Coreia inicia-se nos anos 50 do século passado com a implementação da indústria leve, como a têxtil. Nesse primeiro momento não houve o conhecido esforço exportador, estabeleceu-se a substituição de importações. A década de 1960 manteve-se a substituição de importações ao mesmo tempo que políticas implementadas pelo Estado propiciaram o desenvolvimento de esforço exportador, de uma forma um tanto incipiente inicialmente mas condizentes com a capacidade industrial do país naquele momento. O grande aumento das exportações nessa década – aumentou de cerca de 50 milhões de dólares em 1962 para cerca de 800 milhões em 1970 – permitiram o aumento das exportações que se concentravam em alimentos, insumos para a indústria e os maquinários necessários para a ampliação da produção industrial. A década de 1970 foi a da implementação da indústria pesada – siderurgia, automobilística e química – que seria responsável pela continuidade do avanço das exportações na década de 1980, esta última veria um forte incremento do setor de eletrônicos e computação que continuaram crescendo nas últimas três décadas e hoje respondem por mais de 30% do valor da transformação industrial.
Educação e Ciência & Tecnologia Como Estratégias de Desenvolvimento
É provável que as políticas de crescimento baseadas na indústria e, a partir da década de 1980, também na inovação não tivessem surtido tanto efeito se a Coreia do Sul não tivesse desenvolvido uma estratégia de intensa melhora do padrão educacional da população, toda ela, e não apenas grupos privilegiados. Segundo Massiero,
“O papel da educação no crescimento econômico tem sido objeto de atenção na literatura. Há um relativo consenso de que a educação contribui para o crescimento de diversas formas. Uma delas é através da melhoria da qualidade da força de trabalho que, mais capacitada, estará mais apta para absorver, reproduzir e desenvolver tecnologias, tornando-se, portanto, mais produtivo. E o aumento da produtividade marginal do trabalho traz, como resultado, o crescimento da renda da firma e, em termos agregados, o crescimento da economia”.
Partindo desse ponto de vista, que a educação contribui de forma acentuada para o desenvolvimento econômico, o governo sul-coreano implementou, já na década de 1950, um vasto programa educacional tanto mais necessário porque no ano de 1945 cerca de 80% da população era analfabeta e apenas 2% com mais de 14 anos tinha o ensino médio, além disso não mais que 11% da população em idade universitária estava fazendo graduação em 1970, índice que em 1994 já superava os 70%, para tanto o investimento em educação passou de 2,5% do orçamento em 1951 para 23% em 1995 (MASSIERO, 2002). Os gastos privados, de empresas e famílias, também são elevados,
“Vários outros países também apresentam rápido crescimento dos números relativos a educação formal. O que tem diferenciado a Coréia do Sul dos demais é a prévia expansão da educação de maneira a suportar as exigências das diferentes etapas de desenvolvimento do país. Muitas empresas possuem suas próprias escolas e desde 1974 o governo tornou compulsório o treinamento dos trabalhadores nas empresas de mais de 300 empregados, e com mais de 150 desde 1992, o que levou a constituição de vários centros de treinamento em todo o país. Além deles tem sido crescente as matrículas nos cursos técnicos de 2 a 3 anos de duração. A expansão desses programas ao longo das últimas duas décadas reflete o esforço de capacitação técnica em resposta ao aumento da complexidade industrial e crescentes demandas das empresas”. (MASIERO, 2002, p. 206).
A partir, sobretudo, da década de 1970 o investimento no ensino técnico e no superior foi intensificado tornou a Coreia uma das nações com maior densidade de engenheiros e técnicos do mundo. Desta forma pode-se manter o desenvolvimento industrial, principalmente nos últimos anos, quando a país se estabeleceu em áreas tecnológicas que demandam alto conhecimento. Tendo em vista manter o processo de graduação tecnológica a Coreia do Sul investe pesado em C&T. Segundo BARROS (2002, p.63-64),
“O conceito de C&T adotado nos anos 60 e 70 pelos coreanos é praticamente limitado a capacidade de apreender, absorver, transmitir e usar tecnologia importada. A força do processo de C&T tinha o foco centrado na educação e o esforço não era gerar conhecimento mais criar condições de realizar o que os especialistas coreanos chamaram de “learning by doing”. Essa postura mudou e a nova fase inaugurada em 1986 foca a qualidade da ciência gerada no país, por que objetiva estabelecer uma nova condição expressa na fórmula “learning by research”.
Através da fórmula “learning by research” a Coreia, hoje, se destaca no cenário internacional como produtora de bens com alto conteúdo tecnológico e sendo que provavelmente nenhum outro país do mundo subordinou tanto sua política tecnológica ao desenvolvimento industrial como a Coreia do Sul, que concentra os investimentos em C&T em pesquisa aplicada com pouca participação de pesquisa básica, o que, no futuro, poderia condicionar o desenvolvimento do país. Segundo KIM (2000, p.11) poucos países de industrialização tardia fizeram a transição do “learning by doing” para o “learning by research”, a Coreia do Sul foi um deles. Foi neste momento, que se iniciou na segunda metade dos anos de 1980, que os investimentos em educação e C&T começaram a se conectar de uma maneira mais sólida, pois é nesse momento que a quantidade de pessoas com pós-graduação aumenta de forma considerável, contribuindo para que os sistemas privados e estatais de desenvolvimento tecnológico tivessem acesso a pessoas qualificadas e, portanto, capazes de desenvolver processos e produtos de alta tecnologia. É claro que o país não se tornou um grande produtor de bens de alta tecnologia da noite para o dia, no entanto, já na segunda metade da década de 1980 a Coreia começou a produzir seu primeiro processador de computador, e trinta anos depois, tornou-se um dos países mais importantes da cadeia internacional de valor relativa à indústria de eletrônica e informática.
Conclusão
Sendo um pequeno país com poucos recursos naturais e encravado, durante décadas, no meio da Guerra Fria, a Coreia do Sul foi obrigada pelas circunstâncias a percorrer um caminho diferente do percorrido por tantos outros países da periferia do capitalismo numa era marcada pelo confronto entre as superpotências: EUA e URSS. Com apoio e proteção da primeira traçou uma rota desenvolvimentista com forte atuação do Estado na formulação e execução de planos de desenvolvimento e focado no constante aumento da complexidade da economia nacional, progressivamente modificando a forma de inserção no mercado internacional, inicialmente como fornecedora de bens de baixo valor agregado e atualmente como um dos países mais importantes a integrar as cadeias de valor internacional. Para tanto foram realizadas mudanças estruturais ao longo das décadas de 1950 e 1960, que possibilitaram a modernização da agricultura, o estabelecimento do Estado tecnocrático e a implementação do esforço exportador. Além disso o forte investimento em educação possibilitou a continuidade do desenvolvimento e a transformação do país numa economia industrial onde o conhecimento tem grande importância.
Referências
Alexandre Black de Albuquerque é Mestre em história pela Universidade Federal de Pernambuco
BALDASSO, Tiago Oliveira: Reforma Agrária, Modernização da Agricultura e Industrialização na Coreia do Sul. TCC, Faculdade de Ciências Econômicas, UFRGS, Porto Alegre, 2016.
BARROS, Hélio G.. Política científica na Coréia: evolução da máxima tecnologia contida na educação à máxima ciência contida no conhecimento. In: GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. (Org.).
CEPAL. Cambio Estructural Para la Igualdad: una visión integrada del desarrollo. Comisión Económica Para América Latina y Caribe. 2012.
LEVINSON, Marc. Congressional Research Service. Section Research Manager. February 21, 2018.
MASIERO, Gilmar. A economia coreana: características estruturais. In: GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. (Org.). Coréia: visões brasileiras. Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, Fundação Alexandre de Gusmão, 2002. p. 199-252.
MILTONS, Michelle Merética & MICHELON Ednaldo. Educação e Crescimento Econômico na Coréia Do Sul, S/D.
OEC. The Observatory of Economic Complexity. Em <https://oec.world/en/> acesso em 27 de junho de 2019.
TOUSSAINT, Eric. O Mito da Coréia do Sul: não, ela não se desenvolveu com livre mercado em <https://voyager1.net/economia/o-mito-sul-coreano/#nb12> acesso em 21 de agosto de 2018.
KIM, Linsu. The Dynamics of Technological Learning in Industrialisation. In: Internacional Social Sciense Journal. Holanda. Disponível em <http://www.intech.unu.edu/publications/discussion-papers/2000-7.pdf> acesso em 20/01/2015.

29 comentários:

  1. Com o impulso do governo sul coreano para que os jovens prosseguissem com os estudos, algumas medidas foram tomadas. Contudo, nota-se um efeito colateral gerado pelo mesmo, como altos índices de depressão, suicídio entre outros problemas relacionados, em estudantes de nível médio e superior que não conseguem atingir as metas esperadas pelas grandes empresas. É possível que isso, a longo prazo, afete o desenvolvimento da Coreia do sul, gerando uma crise?

    Crislli Vieira Alves Bezerra

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Alexandre Black
      Olá Crislli Vieira, apesar de sua pergunta fugir do escopo do meu artigo, pois o marco temporal dele é a Coreia do Sul na década de 1950 e 60, sua pergunta é bastante interessante e pertinente, inclusive porque o índice de suicídios nesse país subiu fortemente, passando, segundo a Organização Mundial da Saúde, de uma taxa de 13,8 suicídios por 100 mil habitantes no ano de 2000 para 29,6 em 2016, portanto a taxa mais que dobrou em apenas 16 anos. No entanto há vários motivos para esse aumento, segundo PARK & LESTER (crisis, 2006, v. 27), há uma forte correlação entre divórcios e suicídios e, segundo Kothari & Garg (international Journal of Advance Research and Development, vol 3), a contribuição da população idosa supera as dos mais jovens (14-25 anos) no índice de suicídio, mesmo levando-se em conta que o país detém a maior taxa de suicídio para a população entre 10 – 19 anos do mundo (idem). Do ponto de vista econômico é relativamente fácil determinar as perdas anuais em decorrência da alta taxa de suicídio (são estimadas em seis bilhões de dólares pelo sistema de saúde local), no entanto fazer uma correlação positiva entre suicídios e crise econômica num futuro previsível não nos parece viável, a não ser que essas taxas fossem tão altas que levassem a diminuição da população economicamente ativa, o que não é o caso do país asiático.

      Excluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  3. É salutar a temática abordada, sobretudo, no que tange à influência do capitalismo na sociedade sul-coreana, principalmente, na mentalidade( viés ideológico). É claro, sem desconsiderar os prós e os contras da realidade à época. Sendo assim, gostaria de saber sobre à questão do desemprego no país e sua relação com a política desenvolvimentista vigente, conforme o contexto econômico na década de 50?

    Desde já, parabenizo-o pela escrita e recorte espacial-temporal.

    Maykon Albuquerque Lacerda

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir
    2. Alexandre Black
      Olá Maykon Albuquerque, obrigado por participar do debate. Consideramos que a questão do desemprego não teve uma influência tão direta na política de desenvolvimento sul coreano na década de 1950, foi a soma de vários fatores, claramente influenciados pela Guerra Fria e a “ameaça comunista”, que determinaram a opção pelo desenvolvimentismo. É claro que ao fim da Guerra da Coreia (1950 – 1953), quando o país teve parte considerável da infraestrutura destruída, o desemprego urbano era elevado (ao redor de 25%), no entanto a maior parte da população estava nas zonas rurais onde a reforma agrária tinha sido implementada, e completada, antes do fim da Guerra da Coreia. Além disso a repressão política intensa manteve o movimento sindical sob controle até os protestos populares que resultaram na “revolução de abril” que pôs fim a chamada primeira república.

      Excluir
  4. Excelente texto. Sabe-se que durante esse período, a Coreia do Sul passava por uma ditadura bastante forte, com presidentes militares e uma forte repressão de movimentos considerados subversivos e que pudessem incitar ideias revolucionárias de cunho comunista, tendo em vista que o país vizinho era uma forte ameaça em vários sentidos, sem contar em todo o contexto da Guerra Fria. Minha pergunta, no entanto, é saber se seria possível abordar a ditadura sul coreana e a ditadura brasileira em um comparativo? Apesar de serem países com históricos bem diferentes, as ditaduras possuíam suas semelhanças, com militares no poder e apoio norte americano.
    Alessandro Henrique da Silva

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Alessandro Henrique, obrigado pelo elogio. A década de 1950 foi marcada por uma certa fachada democrática com o governo civil de Syngman Rhee. O alto grau de corrupção, repressão e a demora para as reformas econômicas darem resultados expressivos levou, em 1960, ao movimento conhecido como revolução de abril que pôs fim ao governo Rhee, depois de cerca de um ano de instabilidade o general Park Chung-hee liderou um golpe de estado em 16 de maio de 1961 tornando-se o líder do país até seu assassinato em 1979, é interessante notar que ele promoveu algumas eleições de fachada, exatamente como a ditadura brasileira, mas em 1972 instituiu a lei marcial. Logo Alessandro, sua pergunta é pertinente, está claro que se pode fazer uma história comparada da ditadura brasileira e sul coreana, ainda mais que atualmente a história comparada permite comparar quase tudo, desde que, é claro, não se caia em anacronismos. No caso do Brasil e da Coreia do Sul de início temos dois Estados desenvolvimentistas, mas com fortes diferenças quanto à forma de atuação. O apoio norte-americano diferiu no grau da ajuda econômica, que foi baixa no Brasil e muito alta na Coreia do sul, sobretudo nos anos de 1950, além disso, do ponto de vista econômico foi exatamente durante a ditadura Park que o país adotou a estratégia exportadora e de inovação tecnológica, que terminaria por fazer com que a trajetória entre os dois países se tornassem divergentes a partir da segunda metade da década de 1970.

      Excluir
  5. Alexandre, parabéns pelo estudo!

    Enquanto lia atentamente o seu texto, pensava no Brasil, evidentemente, guardando as devidas proporções. Isto posto, não sei se devia pergunta, mas correrei o risco de não ser muito inteligente: tem a Coreia do Sul alguma coisa a ensinar ao Brasil?

    Abraço!

    Antonio José de Souza

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Toni, a Coreia tem muito a ensinar ao Brasil, primeiro como a melhora da distribuição de renda tem impactos positivos no ambiente institucional, segundo os benefícios econômicos e sociais de médio e longo prazos da melhoria do nível educacional da população e de investimentos em ciência e tecnologia.
      Alexandre Black

      Excluir
  6. Alexandre, parabéns pelo texto, está muito bem embasado e escrito de maneira muito clara.
    Meu questionamento seria, o quão primordial você enxerga a ajuda que os Estados Unidos prestaram a Coréia do Sul afim que essa pode desenvolver-se, numa economia que foi complexando-se cada vez mais ao longo do tempo?

    Henrique Stoffel

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Henrique Stoffel e Pedro Antonio Saraiva de Carvalho Pereira Francez a resposta é a seguinte: a ajuda norte-americana foi, sem dúvida, muito importante. A Guerra da Coreia (1950 – 1953) destruiu parte significativa da infraestrutura da Coreia do Sul, o país perdeu metade da capacidade industrial e quase toda capacidade de geração de eletricidade. A ajuda dos EUA ficou ao redor de 16% do PIB coreano para o período 1953-60 e 4,7% do PIB para o período 1961-70, e quase toda essa ajuda foi a fundo perdido, logo nem endividou o país, nem desnacionalizou sua economia. Além disso, houve ajuda técnica e compras de bens e serviços durante a guerra do Vietnã, e está claro que essa ajuda apenas existiu por causa da guerra fria e a “Teoria do Dominó” que foi adotada pela política externa dos EUA naquela época – entre as décadas de 1950 e 1980 – e afirmava que se um país de uma região caísse sobre influência do socialismo outros na região também poderiam tornassem socialistas, num efeito parecido com peças de dominó derrubando umas as outras. O acesso a esses recursos mantiveram a economia coreana funcionando durante o período de reconstrução, que se encerra por volta de 1960, e ainda permitiu investir na ampliação da capacidade produtiva, o que seguramente seria inviável apenas com recursos próprios dado que a formação de poupança interna ainda era muito baixa. Essa ajuda continua pela década de 1960 e como o auxílio era, em parte, a fundo perdido, como já dissemos acima, esses investimentos tornavam-se propriedades do Estado e/ou do setor privado coreano, evitando a desnacionalização da economia e mantendo as decisões de ordem econômicas dentro do país e não sob controle de empresas dos países centrais, o que, no longo prazo, seria importante para o desenvolvimento da Coreia do Sul, que pode articular políticas desenvolvimentistas em consonância com suas empresas, públicas e privadas, que, a rigor, dominavam todas as áreas de investimento, inclusive as mais dinâmicas, permitindo, assim, o reposicionamento do país como plataforma exportadora.

      Alexandre Black

      Excluir
  7. Olá Alexandre, parabéns pelo texto, algo realmente digno de reflexão. Confesso que, lendo o seu texto, fazia mentalmente um comparativo com relação ao outro lado do Paralelo 38. Os fatos recentes de uma "aproximação" entre as Coreias, apesar de não representar uma aliança ou uma possível unificação, mas pode simbolizar algo mediante ao que expões no texto?

    Grato!

    Jefferson Fernandes de Aquino

    ResponderExcluir
  8. Heloisa Carolina H. de Oliveira7 de agosto de 2019 às 09:14

    Bom dia, gostei muito do texto. Minha pergunta é a seguinte: De fato, os padrões escolares e as notas educacionais coreanas são excelentes, mas esse sistema já não mostra algum sinal de desgaste ou esgotamento por privilegiar muito a competição de desempenho em detrimento do bem-estar dos alunos?

    Heloisa Carolina H. de Oliveira.

    ResponderExcluir
  9. Evidentemente os recursos usados pela Coreia do sul de desenvolvimento tecnológico surtiram os efeitos vistos hoje, eu gostaria de saber se os mesmos “caminhos” tomados pela Coreia funcionariam mesmo nos dias de hoje em outros países? Em países emergentes?

    Gabriel Braga de Souza

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Gabriel Braga de Souza. Parte da experiência sul coreana provavelmente não é mais reproduzível, sobre tudo a relativa ao protecionismo econômico pois fere as regras da Organização Mundial do Comércio – OMC. Áreas intensivas em tecnologia também exigem maiores escalas de produção do que há trinta, quarenta ou cinquenta anos, tornando bem mais difícil a graduação tecnológica, em suma, as chamadas barreiras de entrada são mais “pesadas” atualmente. Estabelecer um modelo exportador também está bem mais difícil, pois a concorrência hoje é muito maior, basicamente seria com todo o sudeste asiático, sendo que alguns países daquela região levaram o nível de exploração da mão de obra a um patamar não desejável de ser igualado e que impõe ainda maiores dificuldades na competição internacional. Por outro lado avanços em educação, ciência e tecnologia, e o estabelecimento de um Estado tecnocrático não são metas fora do alcance e, seguramente, contribuem para um maior desenvolvimento econômico e social.
      Alexandre Black

      Excluir
  10. Boa tarde!

    A Coreia do Sul quando saiu do domínio japonês (1945) foi dividida pela bipolaridade da Guerra Fria. O Norte ficou sob influências soviéticas e o sul, sob a americana. Nessa divisão, o norte ficou com a maioria das fábricas, que lá se localizavam, fazendo com que a Coreia do Sul fizesse uma industrialização tardia, em relação com o mundo, ainda mais com o advento da Guerra da Coreia.

    Nesse panorama, não podemos dizer que, também apesar da forte intervenção estatal, protecionismo e etc, principalmente no Governo Park, a boa relação com o ocidente e o contexto de Guerra Fria alavancaram o mercado do país para se tornar uma superpotência?

    Abraços!

    Pedro Antonio Saraiva de Carvalho Pereira Francez

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Henrique Stoffel e Pedro Antonio Saraiva de Carvalho Pereira Francez a resposta é a seguinte: a ajuda norte-americana foi, sem dúvida, muito importante. A Guerra da Coreia (1950 – 1953) destruiu parte significativa da infraestrutura da Coreia do Sul, o país perdeu metade da capacidade industrial e quase toda capacidade de geração de eletricidade. A ajuda dos EUA ficou ao redor de 16% do PIB coreano para o período 1953-60 e 4,7% do PIB para o período 1961-70, e quase toda essa ajuda foi a fundo perdido, logo nem endividou o país, nem desnacionalizou sua economia. Além disso, houve ajuda técnica e compras de bens e serviços durante a guerra do Vietnã, e está claro que essa ajuda apenas existiu por causa da guerra fria e a “Teoria do Dominó” que foi adotada pela política externa dos EUA naquela época – entre as décadas de 1950 e 1980 – e afirmava que se um país de uma região caísse sobre influência do socialismo outros na região também poderiam tornassem socialistas, num efeito parecido com peças de dominó derrubando umas as outras. O acesso a esses recursos mantiveram a economia coreana funcionando durante o período de reconstrução, que se encerra por volta de 1960, e ainda permitiu investir na ampliação da capacidade produtiva, o que seguramente seria inviável apenas com recursos próprios dado que a formação de poupança interna ainda era muito baixa. Essa ajuda continua pela década de 1960 e como o auxílio era, em parte, a fundo perdido, como já dissemos acima, esses investimentos tornavam-se propriedades do Estado e/ou do setor privado coreano, evitando a desnacionalização da economia e mantendo as decisões de ordem econômicas dentro do país e não sob controle de empresas dos países centrais, o que, no longo prazo, seria importante para o desenvolvimento da Coreia do Sul, que pode articular políticas desenvolvimentistas em consonância com suas empresas, públicas e privadas, que, a rigor, dominavam todas as áreas de investimento, inclusive as mais dinâmicas, permitindo, assim, o reposicionamento do país como plataforma exportadora.

      Alexandre Black

      Excluir
  11. Olá, professor Black. Excelente texto, este que me "abriu a mente" sobre os avanços da Coréia do Sul, país pelo qual achava que se crescimento se deu recentemente, sendo que temos um logo período de mudanças. Minha questão é: Se fosse a URSS que estivesse dando o auxilio no lugar dos EUA, a Coréia conseguiria percorrer esse caminho? e essas politicas internas (feitas naquela época) serviriam de modelo para países (como o Brasil) no atual contexto.

    atenciosamente, Matheus Velho

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Matheus Velho, neste caso podemos comparar objetivamente pois existe a Coreia do Norte, que teve vasta ajuda da União Soviética até os anos de 1980, e a situação atual dos dois países são díspares, no entanto a ajuda dos EUA apenas ocorreu em consequência da Guerra Fria. Hoje, como não há mais a Guerra Fria, essa ajuda não aconteceria. Continuo a resposta abaixo:

      Matheus Velho, vem a resposta que dei para Gabriel Braga de Souza. Parte da experiência sul coreana provavelmente não é mais reproduzível, sobre tudo a relativa ao protecionismo econômico pois fere as regras da Organização Mundia do Comércio – OMC. Áreas intensivas em tecnologia também exigem maiores escalas de produção do que há trinta, quarenta ou cinquenta anos, tornando bem mais difícil a graduação tecnológica, em suma, as chamadas barreiras de entrada são mais “pesadas” atualmente. Estabelecer um modelo exportador também está bem mais difícil pois a concorrência hoje é muito maior, basicamente seria com todo o sudeste asiático, sendo que alguns países daquela região levaram o nível de exploração da mão de obra a um patamar não desejável de ser igualado e que impõe ainda maiores dificuldades na competição internacional. Por outro lado avanços em educação, ciência e tecnologia, e o estabelecimento de um Estado tecnocrático não são metas fora do alcance e, seguramente, contribuem para um maior desenvolvimento econômico e social.

      Alexandre Black

      Excluir
    2. Grato pelas informações professor Black!
      E parabéns por sua pesquisa

      Excluir
  12. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  13. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  14. Olá!

    Parabéns pelo texto, está bastante didático!

    Fica evidente que a Coreia do Sul passou por grandes investimentos educacionais com focos diferentes. Depois de muitos anos investindo em ensinos técnicos e formando engenheiros para trabalharem como mão de obra, passaram a investir na criação de tecnologia. Se pensarmos dentro da conjuntura, todo o investimento em educação e toda a produção que da destaque para o país é voltado para servir o mercado capitalista mundial. Não que isso seja um problema. Porém, como entra a formação humana nos projetos educacionais da Coreia do Sul?

    Fazendo um paralelo com o Brasil, considerando as devidas diferenças, o MEC anunciou recentemente o programa "future-se" que é voltado também para o lado técnico e de inovação tecnologia do ensino com incentivos a criação de startups. Você acredita que podemos alcançar um nível de produção tecnologia como o da Coreia do Sul? E como você imagina que as ciências humanas possam ocupar esse cenário de desenvolvimento tecnológico, uma vez que, a reflexão, a filosofia, o conhecimento humano aparentemente - pra muita gente - não dá retorno imediato?

    Ass.
    Bryan Douglas Martins de Miranda

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Bryan, há muitas críticas em relação à formação humana no sistema educacional da Coreia do Sul, muito voltado ao aprendizado para o mercado, e o impacto negativo que isso teria em relação a criatividade, sobretudo no século XXI quando o país entrou em ramos de tecnologia de fronteira.
      Não acredito que o Brasil consiga alcançar o nível de produção tecnológica da Coreia do Sul pois isso requer aumento substancial dos investimentos em ciência e tecnologia, e eles estão caindo nos últimos anos, um ambiente institucional propício (relativamente tecnocrático em todas as esferas do Estado), disciplina educacional, empresas interessadas em inovação, etc. Esses são fatores razoavelmente distantes da realidade brasileira.
      As ciências humanas assumem papel relevante ao fomentar o espírito crítico e o conflito, pois é da crítica e do contraditório que surge novas ideias, e não da planificação mental, pois a ciência tem como base a tentativa diária de demolir os cânones aceitos.
      Alexandre Black

      Excluir
  15. Olá,gostaria de saber se a 3 revolução industrial também foi um fator que favorecel o desenvolvimento da Coreia do Sul,Já que após a guerra da Coreia 1950/1953, a Coreia do Sul implementou um conjunto de políticas para formentar o seu desenvolvimento industrial.

    Larissa da Silva Batista.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Larissa, não creio que a terceira revolução industrial tenha favorecido o desenvolvimento da Coreia do Sul, per se, mas sem dúvida favoreceu ao conjunto dos países avançados, o que terminaria por favorecer a própria Coreia após a década de 1970, ou seja, o que favoreceu o desenvolvimento do país foi à adoção de políticas que permitiram que a terceira revolução industrial criasse raízes no solo coreano.
      Alexandre Black

      Excluir
  16. Olá,Na sua perspectiva,os Estados Unidos e o Capitalismo foram os pilates para o desenvolvimento da Coreia do Sul após a guerra da Coreia 1950/1953,para serem o que são hoje?
    Larissa da Silva Batista

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Larissa da Silva Batista, vem a resposta que dei para Henrique Stoffel e Pedro Antonio Saraiva de Carvalho Pereira Francez: a ajuda norte-americana foi, sem dúvida, muito importante. A Guerra da Coreia (1950 – 1953) destruiu parte significativa da infraestrutura da Coreia do Sul, o país perdeu metade da capacidade industrial e quase toda capacidade de geração de eletricidade. A ajuda dos EUA ficou ao redor de 16% do PIB coreano para o período 1953-60 e 4,7% do PIB para o período 1961-70, e quase toda essa ajuda foi a fundo perdido, logo nem endividou o país, nem desnacionalizou sua economia. Além disso, houve ajuda técnica e compras de bens e serviços durante a guerra do Vietnã, e está claro que essa ajuda apenas existiu por causa da guerra fria e a “Teoria do Dominó” que foi adotada pela política externa dos EUA naquela época – entre as décadas de 1950 e 1980 – e afirmava que se um país de uma região caísse sobre influência do socialismo outros na região também poderiam tornassem socialistas, num efeito parecido com peças de dominó derrubando umas as outras. O acesso a esses recursos mantiveram a economia coreana funcionando durante o período de reconstrução, que se encerra por volta de 1960, e ainda permitiu investir na ampliação da capacidade produtiva, o que seguramente seria inviável apenas com recursos próprios dado que a formação de poupança interna ainda era muito baixa. Essa ajuda continua pela década de 1960 e como o auxílio era, em parte, a fundo perdido, como já dissemos acima, esses investimentos tornavam-se propriedades do Estado e/ou do setor privado coreano, evitando a desnacionalização da economia e mantendo as decisões de ordem econômicas dentro do país e não sob controle de empresas dos países centrais, o que, no longo prazo, seria importante para o desenvolvimento da Coreia do Sul, que pode articular políticas desenvolvimentistas em consonância com suas empresas, públicas e privadas, que, a rigor, dominavam todas as áreas de investimento, inclusive as mais dinâmicas, permitindo, assim, o reposicionamento do país como plataforma exportadora.

      Alexandre Black

      Excluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.